A viagem de
autocarro começou com um forte balanço, enquanto subíamos por uma estrada que
não podia deixar de ser íngreme, por estas paragens é assim. Nos lugares ao
lado do meu viaja um jovem casal que vem de fazer a mesma rota que nós. Facto
surpreendente, trazem consigo um bebé, que, pelos meus cálculos, não deve ter
mais de nove meses. No chão repousa uma mochila de o carregar às costas. O bebé
está cansado e resmunga. Com o balançar do autocarro, acabamos por adormecer, o
casal e o bebé também.
A viagem é
longa, quando acordo, sem saber quanto tempo decorreu, sou surpreendida pelas
vistas espantosas: vales verdejantes mais abaixo da estrada, que corre sempre,
parece-me, num equilíbrio muito precário à beira destas escarpas profundas. Há
pequenos bosques de pinheiros por onde repousam vacas indolentes. A tarde já
vai avançada. O bebé começou a chorar de impaciência e cansaço. Se fosse eu,
começava a afligir-me, o que havia de afligir ainda mais o bebé (por isso nunca me
meti nestas aventuras com crianças muito pequenas, mas por aqui, as crianças não
parecem ser obstáculo nenhum e é uma lição que aprendo: no pasa nada). A mãe espanhola limita-se a cantar-lhe uma canção
de embalar numa voz que não posso deixar de achar muito doce e a menina volta a
adormecer. Eu já não durmo.
Dou conta de
que o percurso até Cangas de Onis se faz por uma garganta que só pode ser o
famoso desfiladeiro de Los Beyos. A
estrada é muito estreita, mesmo assim tem duas faixas. A cada curva mais
fechada, ficamos com a impressão que o autocarro vai embater na parede oposta
desta estreita passagem que a montanha permitiu. As paredes são abruptas –
agora sei exatamente o significado desta palavra – ou seja, a pique, de rocha
maciça, mas recortada de maneira caprichosa. Não consigo desprender os olhos, há
momentos em que uma parede a direito me corta a respiração, entre o medo que o
autocarro se roce por ela, cortando-se naquela lâmina, e de que se afaste
correndo o risco de mergulhar no precipício, não consigo perceber o que me faz
suspender a respiração. De vez em quando, cruzamos um rio numa ponte de que mal
percebo os contornos. As cores variam entre o verde muito verde e todas as
tonalidades de cinzento, ora quase branco, ora quase negro, da rocha dura que
nos ladeia. Descubro mais tarde que a estrada corre ao lado do Rio Sella e que
desce até Cangas de Onis desde a província de Leão, onde aliás ficava situada a
aldeia de Caín.
Chegados a
Cangas de Onís, tempo para mudar de autocarro, que finalmente nos há de
transportar até Poncebos. No total, a viagem de regresso leva mais de três
horas de autocarro, foi grande a volta que demos no dia de hoje. Em direção a
Poncebos, a estrada não melhora. Há momentos em que aperto a mão do Tó com
força, tenho mesmo medo. Como viajo do lado direito do autocarro, à janela,
posso jurar que houve momentos em que me senti suspensa no vazio. Não havia
berma e o motorista, na minha perspetiva, ia demasiado depressa. A ideia de um
acidente não me sai da cabeça e só quero que esta viagem infernal chegue ao
fim. Sei que admiro a paisagem com fascínio, mas o meu instinto de sobrevivência
obriga-me a desejar pela segurança de paragens com cota mais baixa e com os pés
assente na terra. A verdade é que nunca gostei de voar…
O troço até ao
parque de estacionamento volta a devolver-nos às margens do rio Cares que,
selvagem, continua a correr no seu leito estreito. Fechamos o ciclo já com
saudades deste dia que nos colocou perante a esmagadora força da natureza e
estamos gratos e reconhecidos e muito conscientes da nossa pequenez. Fica, sem
dúvida, a vontade de voltar.
Regresso ao
parque e jantar. Nova experiência com a Sidra Asturiana. Que desilusão!!! A
sidra afamada das Astúrias sabe a uma água-pé deslavada e dizemos em voz alta a
nossa perplexidade, estávamos convencidos de que a sidra ao natural devia ser
um parente pobre. Estávamos, como havemos de ver, muito enganados e já não
estava longe o momento da nossa conversão, que seria dali por dois dias.
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