Obrigou-se a pensar nela, àquela hora havia mãos
quentes a tomarem-lhe os seios, a apertá-los, uma boca ávida sugava-lhe os
mamilos. Ouvia-a a respirar pesadamente, cada vez mais depressa. Sabia muito
bem os sons que ela emitia quando estava no cio. Ela tirava a camisola fina,
por cima da cabeça, o cabelo descompunha-se, não havia tempo para o tirar da
cara. Ela estava por cima, abelha-mestra, mexia-se, as mãos apoiados no peito
dele. O primeiro gemido soltou-se-lhe da boca. O gemido despertou-o, porque foi
ele que gemeu. Pegou na colher e mexeu o líquido. Extenuado, caiu sobre a cama,
como se a tivesse amado ali, como tinha amado e agora era inexorável. Os olhos
ficaram parados na janela e de novo gostou da luz que vinha de fora, das
sombras que as árvores da praça projetavam na parede e seguiu esse movimento.
Era preciso acabar, deixar tudo pronto para a sua hora, aquela hora em que se
decidira, em que se via muito mais decidido do que ela alguma vez tinha
imaginado, e riu-se e voltou a sobressaltar-se com o som do seu riso. Quer era
isto? Não podia fazer barulho, era preciso que tudo ficasse inominável.
Rebolou
para o seu lado da cama, ajeitou a almofada entre o ombro e o pescoço e estava
bem. Sem querer enroscou-se e, tudo pronto, preparou-se para dormir. De
repente, abriu os olhos para o escuro, uma exclamação saiu-lhe da boca, faltava
uma coisa: a chávena dele. Era preciso compor o cenário, para parecer que se
tinha cansado de esperar. Empurrou o cansaço, empurrou com força e ergueu-se
ainda uma vez. Com passos pouco seguros foi à cozinha e trouxe a outra chávena
que pousou sobre a sua mesinha. Deitou-se, respirando profundamente e ficou à
espera no escuro. Sem saber como, o cansaço regressou e tomou-o na sua lassidão
e adormeceu.
Estremunhado,
acordou perdido, sobressaltado, sem saber bem o que o despertara. Procurou na
mesa ao lado o relógio. Os ponteiros fosforescentes indicavam cinco da manhã.
Confuso, procurou lembrar-se do dia, seria dia de trabalho? Não, hoje não ia
trabalhar. De repente assomou-lhe ao espírito a sua noite, recuperou tudo com
rapidez. Ela ainda não tinha chegado. Então o que tinha feito com que
despertasse? Ao ouvir o ruído metálico da fechadura, percebeu. Ela estava a
chegar. Chegava assim também a hora decisiva. Chegaram juntas, ela e a hora.
Cautela, era preciso desempenhar bem o seu papel – afinal era o papel
principal, e a letra de uma canção insinuou-se no espírito. Virar-se para a
parede, assim quando ela entrar não descortinará o seu rosto. Pediu mentalmente
que ela não fizesse nada para o acordar. Não poderia olhá-la sem evitar que
algo do que nele se agitava e borbulhava viesse a explodir-lhe no rosto. Fez um
esgar, era uma careta, não sabia que era tão ardiloso. Repetiu mentalmente as
coisas que ela fazia, pendurava a carteira, agora estava a tirar os sapatos,
primeiro um pé, depois o outro, enquanto andava ia desapertando a camisola e as
calças, empurrou a porta da casa de banho, olhou-se no espelho, virando o rosto
de um lado para o outro. O ruído indistinto de frascos que se entrechocavam
confirmou-lhe tudo o que compusera com o espírito atento. Daí a pouco entraria
no quarto, sem acender a lâmpada de cima para não o acordar. Ligaria o
candeeiro da sua mesinha que espalharia uma luz branca em círculo. Havia de se
despir em frente ao espelho, nesse momento gostaria de olhar para ela enquanto
aquele corpo amado ia surgindo das roupas, primeiro as pernas, a visão das
costas curvas, depois havia de se endireitar e tirar a blusa, o sutiã e pelo
espelho ficavam visíveis os seios macios. Rapidamente, ela voltar-se-ia para o
armário e escolheria uma peça leve e curta para dormir.
Sobressaltou-se outra vez ao ouvir a
porta do armário a fechar-se, ela já cumprira o seu ritual noturno. Sentiu a
cama a afundar do lado dela quando ela se sentou. Reteve a respiração. Seguiu
os olhos dela para o tabuleiro, sabia que ela olhava a chávena com o chá. Seria
agora? Fez força para se conter, para não gritar para que ela parasse, que era
veneno, chorando já no seu regaço abraçando-a, querendo que ela lhe prometesse
tudo o que lhe tinha tirado nestes últimos anos. Claro que nada foi assim. Ela
apagou a luz e deitou-se e ele abriu os olhos numa interrogação cega para o
escuro. Será que bebeu o chá? Distraiu-se e tinha perdido o fio à meada e agora
não sabia do que tinha imaginado aquilo que realmente acontecera.
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